Quando fui informado, no início deste mês, que o astrônomo Parke Kunkle defende que as mudanças no alinhamento terrestre alteraram as datas dos signos do zodíaco, e mais, que existe um décimo terceiro (13º!) signo, Ophiuchus, ou Serpentário, pensei que tragédia pouca seria o meu signo agora ser este último. E é. Uma catástrofe psíquica me invadiu. Confesso, já está claro nesse momento: eu leio horóscopo... Há 3.000 anos estão definidos os signos e a astrologia tal como todos conhecemos, daí aparece um sujeito e... tcharan! Tudo muda? Como assim? É uma nova interpretação do céu, do posicionamento da Terra, e que inclui uma nova constelação, a mesma de Ophiuchus.
Segundo a astróloga Barbara Abramo, no entanto, não há motivos para arrancar os cabelos, porque, como um sistema simbólico fechado, diferente da Ciência moderna que conhecemos, que incorpora avanços, descobertas, inovações, transformações, o novo zodíaco pode ser experimentado por qualquer um. Porém, isso não altera as "composições" que se faz com aquele sistema de 12 signos tradicional. Abramo compara a astrologia à música, teoricamente, como se as "composições" com um novo zodíaco apenas gerassem novos contextos e leituras, tal como uma "nova nota musical" não iria invalidar a história da música e as composições já existentes, apenas possibilitaria novos arranjos.
A minha pertubação diminuiu, mas de qualquer modo posso ser duas pessoas distintas para os Céus, e ao mesmo tempo, com duas constelações. É uma espécie de esquizofrenia astral. E muitos também trocaram de signo com a possibilidade do novo sistema.
(Liniers)
Se nosso dia-a-dia for encarado como uma partida de xadrez, de certo modo, Parke Kunkle trocou o tabuleiro e trouxe uma peça nova, inclusive, podendo ainda dar novos movimentos a cada uma das peças na partida. A astrologia parece, assim, um mapa da convivência humana, dá os limites, as possibilidades e também aponta as tendências para determinadas ações, com cada uma das peças, ou signos, dispostos sobre um tabuleiro imaginário. Com a astrologia, ao invés de 16 peças, temos 12 signos, ou 13 agora, e um conjunto de orientações e tendências segundo algumas combinações e... zaz: o jogo esta aí!
Estranho? Não, a comparação entre a vida e o xadrez não é nova. Por exemplo, já foi feita com maestria dispensável de comentários por João Guimarães Rosa em "Minha Gente", conto de Sagarana. E recentemente encontrei outra, dos anos 90, em Acerca de Roderer, novela curta do argentino Guillermo Martínez, que utiliza a metáfora do xadrez diferentemente de Guimarães Rosa.
"Acerca de Roderer" conta a história do encontro de dois garotos que se conheceram jogando xadrez. Um deles, Roderer, é recém chegado na cidade, e aos poucos vai se revelando um sujeito enigmático, encerrado em seu próprio universo. A novela se desenrola contrapondo a vida do protagonista, diga-se de passagem, aparentemente, um alter ego do escritor Martínez, pois ambos seguem para a Universidade estudando Ciências Matemáticas, e de Roderer, que prefere manter-se concentrado em seus pensamentos misteriosos, tentando decifrar sistemas filosóficos sozinho, e para isso precisa daquela coisa simples e de fácil compreensão para todos nós: tempo. O xadrez, a todo instante, parece permear o enredo em meio às estratégias pessoais dos personagens principais, e pequenas surpresas, embora o desfecho acabe esperado, como um xequemate anunciado algumas jogadas antes:
"Conocía bien ese tipo de tormento, pero había creído hasta entonces que solamente yo lo sufría; la imposibilidad de elegir entre dos opciones triviales y absolutamente indiferentes, la horrible vacilación de la inteligencia que oscila de una a la otra y nada puede discernir, que argumenta en el vacío sin encontrar una razón decisiva mientras el sentido común se burla y la azuza: da lo mismo, da lo mismo."
Se faltou zodíaco na trama, não faltaram pequenas discussões filosóficas para prender o leitor. Nada também que nos exigisse um conhecimento aprofundado da história da filosofia para acompanhar o livro. Nesse sentido, o pequeno romance de Guillermo Martínez lembra O Mundo de Sofia, de Jostein Gaarder, mas bem mais modesto.
No fim das contas, além de um signo novo ou não, a comparação da astrologia com a música e com o xadrez mostra que o universo de combinações, ou de possibilidade de ações é bastante ampla, e que se sabemos alguns movimentos possíveis das peças, ou das características astrais, dos perfis, os arranjos com cada um deles possui escopo, senão infinito, largo o suficiente para que qualquer leitura seja apenas mais uma. Sem contar que, ao mesmo tempo em que somos "jogadores", para os astros também somos "peças" num jogo que não fazemos muitas escolhas.
Mentira, não acredito em Astrologia, mas me divirto um bocado!
1 palpites:
Mais ou menos neste sentido, me parece que tem havido uma divisão bizarra na carga dos termos. Astronomia - a ciência justifica. Horóscopo - coisa do senso comum. Não é um decorrente do outro?
O Mekaru deve falar com muita propriedade, pois ele é o racionalista mor por aqui, que não acredita nas tirinhas de jornais.
Mas que eu tenho tudo haver com escorpião, isso eu tenho!!
Abraços!
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