terça-feira, 28 de junho de 2011
Luci
domingo, 26 de junho de 2011
Imagens de Refrigerante
Em muitos lugares do interior, o refrigerante vinha dentro de um saquinho. Era legal assoprar no canudo pra fazer bolha, à revelia de minha mãe. Mas na escola, propositalmente deixava de pedir o refrigerante, gostava de pensar que a menina que me propunha um golinho no recreio estava oferecendo mais que a tubaína. A primeira vez que descobri que deixava de ser criança foi quando percebi que já era mais comum levar o copo à boca do que abaixar a cabeça para que a boca chegasse ao canudo.
Hoje, minha vida é inventar motivos para sabe-se lá o que. Só sei que corro, corro, corro. Socorro: chuva de cacos, e eu me esquivando, um por um. Lá longe, sob um toldo vermelho, homens sem cabeças dividem uma coca-cola esperando a chuva passar. Parecem dar gargalhadas.
No fast food,um velho gordo come compulsivamente, já são três copos de refrigerante vazios em sua mesa. “Não é fome”, penso comigo. Na outra mesa, dois garotinhos discutem, um zomba do outro por ter dinheiro pra comprar o sorvete mais caro, ao contrário do amigo, que logo retruca e aponta com o dedo: “Nem ligo... Quando você for velho, vai ficar como aquele velho gordo”. A mãe, tia, irmã, ou coisa que o valha que acompanhava os meninos não consegue segurar a gargalhada e engasga-se com a coca-cola, que chega a sair pelo nariz. Se dissesse que não pensei “bem-feito”, mentiria.
Lá estava ela, bebendo uma latinha de refrigerante em uma das mesas, sozinha. Segurava o canudo com dois dedos: forte o bastante para não escapar dos lábios e suave o suficiente para não atrapalhar o fluxo do líquido. Entreguei uma florzinha que encontrei no meio do caminho e ela sorriu. Mas só acreditei que gostou de verdade do presente quando deixou a latinha inacabada sobre a mesa e saímos. Em uma mão ela carregava a flor, na outra me carregava.
terça-feira, 21 de junho de 2011
postagem em Debate
quinta-feira, 9 de junho de 2011
Coluna do Leitor - Um Laicismo Equivocado
Iranianas choram por conta da decisão da FIFA pela preservação de um
espaço público laico e democrático
Foi com pesar que soube da notícia de que a seleção iraniana feminina de futebol havia sido desclassificada das eliminatórias para a próxima edição dos jogos olímpicos, que acontecerão em Londres, em 2012. E o mérito não é o futebol desta equipe, que nunca vi em campo. A eliminação é decorrente do fato de elas terem entrado em jogo, contra a seleção jordaniana, cobrindo suas cabeças com o véu (vestimenta mais do que conhecida, e comum na cultura dos países de maioria muçulmana).
A FIFA, entidade máxima do futebol mundial (a despeito de todos os casos de corrupção que a envolveram nestas últimas semanas), estabeleceu protocolo para que nos jogos de futebol sejam proibidas quaisquer manifestações de caráter ideológico, pessoal, comercial e, como se vê, religioso.
Discussão semelhante, a respeito de manifestações religiosas, surgiu na Copa de 2010, por conta de críticas a jogadores que, em suas entrevistas ou em comemorações de gols, faziam vistosas exibições de textos com referências a figura de Jesus Cristo, ou declarações em que enfatizavam seus agradecimentos a Deus.
Esta busca por um terreno laico para o exercício do esporte, como algumas autoridades do mundo da bola, principalmente europeus, tem procurado afirmar, parece estar em um âmbito bastante equivocado. Eu poderia dizer até, perigoso.
Sempre fui crítico deste tipo de política de contenção de manifestações. No primeiro momento em que surgiram as críticas aos jogadores cristãos a respeito de seus proselitismos dentro das quatro linhas, sempre concordei que qualquer exagero deveria ser discutido e trabalhado em outras esferas que não o da proibição pura e simples. O futebol, como principal esporte mundial, envolve diversas identidades culturais, inclusive religiosas. Portanto, sempre entendi que atitudes sensatas deveriam trabalhar o esporte como espaço democrático de manifestação de idéias e identidades, sob a égide da tolerância e do diálogo.
Agora, a proibição da seleção feminina iraniana de participar das próximas olímpiadas, por conta do uso do véu, é evidência maior de que, não apenas a FIFA não se dispõe à construção de um diálogo internacional a respeito das diferentes identidades culturais, como demonstra que sua decisão bebe da mesma fonte das políticas de intolerância secular que ascendem em um número significativo de países europeus, baseadas no discurso de que o espaço público laico deve ser preservado de qualquer interferência de fundo religioso, e que todos os cidadãos, a despeito de suas crenças e valores, deve submeter-se em última instância à tutela do Estado nacional e isento de valores religiosos.
É necessário observar, porém, que tais políticas inserem-se em um contexto agudo de emergência de uma nova direita nacionalista, temerosa com o ingresso de contingentes de imigrantes, sobretudo vindos de países de predominância muçulmana - os mesmos países que, em época anteriores, foram sugadas por estes Estados europeus, antigos impérios coloniais que interferiram (e até hoje interferem) na soberania destes povos.
Em tempos de debates acalorados sobre a inclusão de novos atores sociais na cena política, de um necessário revigoramento das discussões a respeito do multiculturalismo, e de um novo ascenso do movimentos democráticos (no mundo árabe, e que já bate à porta dos países europeus), a política de intolerância à identidade religiosa só possibilita afirmar que o laicismo, como eixo organizacional do Estado e da sociedade contemporânea, necessita assumir um novo significado, pelo qual não seja capaz de construir (e nem mesmo de tangenciar) discursos de exclusão de identidades culturais, sobretudo religiosas.
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Sydnei Melo é sociólogo e misturou-se com a “gente diferenciada” deste blog logo na faculdade. Cristão crítico, sempre se posicionou sem medo sobre todos assuntos.
quarta-feira, 8 de junho de 2011
Não me dê conselhos
- Oi, meu nome é Caio e estou a 12 dias sem beber.
- Pô, de novo? Você não consegue engatar um mês sem recair? Pensa na Mari pelo menos!
- Falou o senhor-bom-moço! O que você está fazendo aqui, então, mané?
Existe uma regra nos grupos Alcoólicos Anônimos que é bastante simples: ninguém comenta o problema do outro. Você vai, fala dos seus problemas e, se tudo der certo, dos seus progressos. Ouve o depoimento dos outros e pensa a respeito do que foi falado. Ninguém dá conselhos.
O conselho tem um poder perverso. Tira o foco de nós. É simples. Quando o outro fala você pode pensar no que ele está fazendo errado ou o que você está fazendo errado. E ver o problema do outro é muito mais fácil.
É engraçado isso. A gente só enxerga a nossa fraqueza no outro, quando não pode apontá-la nele.
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Li esses dias o projeto de mestrado do Hugo, Esmeralda – Por que não dancei: autobiografia como exercício etnográfico e um pensamento ficou me perseguindo, me desconcentrando e me desconcertando a cada linha:
- Se toda crítica é autobiográfica. Por que não o contrário?
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Levei o texto do Hugo e essa pergunta para caminhar comigo por outras leituras e acabamos nos encontrando com esse texto do Luís Fernando Veríssimo sobre Fellini.
“Sendo o mais narcisista, Fellini é o mais italiano dos diretores italianos. E o mais divertido. O narcisismo italiano não implica introspecção ou exagerada auto-analise. Nem um fascínio exclusivo com o próprio umbigo. Ao contrário, é tão expansivo e abrangente que requer um espelho do tamanho da Itália.”
Um espelho do tamanho da Itália é uma autobiografia, uma crítica ou um exercício etnográfico?
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Querido Hugo, sua companhia em meus pensamentos ligou vários pontos. Acreditei ter entendido provisoriamente tudo sobre o mundo e sobre mim.
Essa separação entre crítica e autobiografia que me tirou o sono e me encurtou as unhas é absurda. É impossível falar de si sem falar do mundo e ingênuo achar que fala do mundo sem falar de si. Mas que bobagem, não?
“Parece-me um paradoxo crucial. Para existir plenamente como indivíduos, temos de nos inscrever numa narrativa mais ampla que a nossa.” (Jonathan Nossiter, Gosto e Poder)
Claro que hoje eu acordei com mais perguntas. Mas eram outras.
Obrigado,
Caio
P.S.: Peço apenas um favor. Só por hoje, não me dê conselhos, que eu estou em construção.
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“Isso de querer ser exatamente o que agente é, ainda vai nos levar além” (Paulo Leminski)
terça-feira, 7 de junho de 2011
Amai-vos uns aos outros