"É reconhecidamente um dos pontos de comércio mais elegantes da cidade. A rua, de acordo com a Mystery Shopping International, foi eleita uma das oito ruas mais luxuosas do mundo, e é o mais pujante símbolo dos Jardins, região de São Paulo que concentra grande parte do comércio de rua de luxo do país. Uma ampla reforma foi realizada durante 2006 ao custo de 8,5 milhões de reais, com enterramento de fios e padronização do mobiliário urbano. Cerca de metade do valor das obras é de origem de verbas municipais. No convite acerca da inauguração distribuído à imprensa, lia-se em um trecho: 'Poeira, marteladas e barulho acabaram. No lugar dos operários, homens e mulheres bem vestidos e com a aparência favorecida em todos os aspectos voltam a circular pelas calçadas da rua Oscar Freire'." (trechos retirados do Wikipedia sobre a rua Oscar Freire, São Paulo)
Lá, na rua Oscar Freire, nas paredes de uma loja especializada em óculos de sol, acaba de ser inaugurada uma exposição com fotos clicadas por moradores de rua. Antes, os mesmos passaram por 5 meses de curso em fotografia digital. A ideia é fruto de parceria entre o Instituto Brasis e a loja Op Art, dos quais Marcos Amaro é presidente e dono, respectivamente. A exposição, na sequência, deve passar pela Daslu, loja de artigos de luxo localizada no bairro do Morumbi cercada por imensa favela.
Lá, na rua Oscar Freire, nas paredes de uma loja especializada em óculos de sol, acaba de ser inaugurada uma exposição com fotos clicadas por moradores de rua. Antes, os mesmos passaram por 5 meses de curso em fotografia digital. A ideia é fruto de parceria entre o Instituto Brasis e a loja Op Art, dos quais Marcos Amaro é presidente e dono, respectivamente. A exposição, na sequência, deve passar pela Daslu, loja de artigos de luxo localizada no bairro do Morumbi cercada por imensa favela.
---
Há algum tempo, a mesma Daslu, cuja dona é Eliane Tranchesi, cedeu, polemicamente, espaço para o lançamento do excelente livro do rapper brasileiro MV Bill, intitulado "Falcão, meninos do tráfico", que relata situações de violência vividas por crianças das favelas brasileiras ligadas ao tráfico de drogas. À época, Lúcia Mineiro, socióloga - tinha que ser! - chamada para dar uma palestra durante o evento, causou alvoroço:
- "Estamos aqui na Daslu, no templo do consumismo! Isso aqui também é responsável pela violência."
Imediatamente, a líder comunitária da favela pegou o microfone, defendeu a - segundo ela - "amiga pessoal" e dona da botique, emocionando os clientes presentes.
- "O que essa mulher [Lúcia] falou não tem nada a ver! Misturou consumismo com violência! Estamos aqui num evento tão bonito..."
Por fim, foi a vez da própria Eliane, que nove meses antes havia sido presa por sonegação fiscal, advogar-se a si mesma.
- "Ela tem que entender que o consumo é bom! Nós, empresários, geramos empregos, pagamos impostos, gente!"
---
As imagens expostas na Op Art por moradores de rua impressionam pela qualidade das imagens e densidade autobiográfica que contêm em si, escapando de estereótipos ou dramatizações autopiedosas. Assim como o livro de MV Bill, além de muito bem escrito, mostrou um Brasil errante, até então pouco conhecido em tamanha riqueza de detalhes.
O que está em questão, no entanto, não é a qualidade dos trabalhos, mas a estratégia do "choque" provocado ao levar para a elite realidades tão contrastantes através da arte. Há tempos ouvimos sobre a "perversidade de nossa elite". Alguns pensadores reformistas defendem uma modificação cultural e humanista nas classes dominantes como condição para que haja o bem estar social - ou, nas palavras de Marcos "o capital é uma ferramenta quase sempre usada para gerar mais capital. Eu estou tentando entender como usar ele para criar cidadania”. Mas para mim, o argumento de diminuir o hiato entre as classes é inconsistente. Porque simplesmente não há um hiato, hiato algum, entre o consumidor da alta moda e o morador de rua ou traficante da favela. Há, sim, uma relação de interdependêcia e de dominação. Porque, em última instância, a socióloga está certa, todos queremos aquele tênis, aquele vestido, aquele sanduíche - seja qual for a classe. A "arte social", neste caso, posta à contemplação nas paredes ou limpando nome de marcas, não basta. É preciso algo maior que isso e menor que um assalto. Se quer tocar e modificar de verdade a elite, a arte à ela levada deve conter o tom de denúncia, mostrar sua responsabilidade como topo da pirâmide. Talvez a fala da socióloga pode ter sido uma boa tentativa, mas além de constrangimento e subsídio para essa postagem, pouco efeito surtiu. Isso porque dizer aos templos do consumo qual seu papel nesse circo de horrores ultrapassa os limites da vinculação da marca às questões sociais, "pega mal". Aí que está: Por mais que seja tudo bem intencionado, há um hiato, aí sim, entre o que transforma de verdade uma atitude e o que apenas serve como desencargo de consciência ou valorização da marca.
Esse é o ponto de meu ceticismo.
Espero estar errado.
Há algum tempo, a mesma Daslu, cuja dona é Eliane Tranchesi, cedeu, polemicamente, espaço para o lançamento do excelente livro do rapper brasileiro MV Bill, intitulado "Falcão, meninos do tráfico", que relata situações de violência vividas por crianças das favelas brasileiras ligadas ao tráfico de drogas. À época, Lúcia Mineiro, socióloga - tinha que ser! - chamada para dar uma palestra durante o evento, causou alvoroço:
- "Estamos aqui na Daslu, no templo do consumismo! Isso aqui também é responsável pela violência."
Imediatamente, a líder comunitária da favela pegou o microfone, defendeu a - segundo ela - "amiga pessoal" e dona da botique, emocionando os clientes presentes.
- "O que essa mulher [Lúcia] falou não tem nada a ver! Misturou consumismo com violência! Estamos aqui num evento tão bonito..."
Por fim, foi a vez da própria Eliane, que nove meses antes havia sido presa por sonegação fiscal, advogar-se a si mesma.
- "Ela tem que entender que o consumo é bom! Nós, empresários, geramos empregos, pagamos impostos, gente!"
---
As imagens expostas na Op Art por moradores de rua impressionam pela qualidade das imagens e densidade autobiográfica que contêm em si, escapando de estereótipos ou dramatizações autopiedosas. Assim como o livro de MV Bill, além de muito bem escrito, mostrou um Brasil errante, até então pouco conhecido em tamanha riqueza de detalhes.
O que está em questão, no entanto, não é a qualidade dos trabalhos, mas a estratégia do "choque" provocado ao levar para a elite realidades tão contrastantes através da arte. Há tempos ouvimos sobre a "perversidade de nossa elite". Alguns pensadores reformistas defendem uma modificação cultural e humanista nas classes dominantes como condição para que haja o bem estar social - ou, nas palavras de Marcos "o capital é uma ferramenta quase sempre usada para gerar mais capital. Eu estou tentando entender como usar ele para criar cidadania”. Mas para mim, o argumento de diminuir o hiato entre as classes é inconsistente. Porque simplesmente não há um hiato, hiato algum, entre o consumidor da alta moda e o morador de rua ou traficante da favela. Há, sim, uma relação de interdependêcia e de dominação. Porque, em última instância, a socióloga está certa, todos queremos aquele tênis, aquele vestido, aquele sanduíche - seja qual for a classe. A "arte social", neste caso, posta à contemplação nas paredes ou limpando nome de marcas, não basta. É preciso algo maior que isso e menor que um assalto. Se quer tocar e modificar de verdade a elite, a arte à ela levada deve conter o tom de denúncia, mostrar sua responsabilidade como topo da pirâmide. Talvez a fala da socióloga pode ter sido uma boa tentativa, mas além de constrangimento e subsídio para essa postagem, pouco efeito surtiu. Isso porque dizer aos templos do consumo qual seu papel nesse circo de horrores ultrapassa os limites da vinculação da marca às questões sociais, "pega mal". Aí que está: Por mais que seja tudo bem intencionado, há um hiato, aí sim, entre o que transforma de verdade uma atitude e o que apenas serve como desencargo de consciência ou valorização da marca.
Esse é o ponto de meu ceticismo.
Espero estar errado.
---
Misturas Relacionadas
Filme: "Um sonho possível"
11 palpites:
Tá de parabéns Thiago, esse acho que foi o melhor que vc soltou até agora!
Achei um pouco depressivo, relendo..
Nada,
está sensato!
Mekaru, responda a minha pergunta sobre o seu texto, preguiçoso!
Eu estive nesse evento e posso dizer que para mim causou um choque de imensa alegria e emoção ver a elite paulistana aplaudindo de pé moradores de rua que também são artistas!
Afirmo, com todas as letras que está sendo dado um choque de realidade na elite paulistana como nunca imaginei ver em minha vida.
E pelo que vi no texto, muito bem escrito, o choque não está sendo apenas na elite, mas nos setores sociais também.
Esqueci de dizer que a elite, tanto como a classe operária é alienada e vive numa realidade de difícil compreensão de quem está de fora.
Vejo que os setores sociais também devem acolher a alienação da elite como um problema social e não como um problema moral.
Belo texto! Sinta-se a vontade para entrar em contato.
marcos@amaroparticipacoes.com
Podemos debater mais sobre o tema!
Marcos Amaro
"o argumento de diminuir o hiato entre as classes é inconsistente"...
"uma relação de interdependêcia e de dominação".
A "arte social", neste caso, posta à contemplação nas paredes ou limpando nome de marcas, não basta...
"Se quer tocar e modificar de verdade a elite, a arte à ela levada deve conter o tom de denúncia, mostrar sua responsabilidade como topo da pirâmide"...
"há um hiato, aí sim, entre o que transforma de verdade uma atitude, e o que apenas serve como desencargo de consciência ou valorização da marca".
Olá,
Gostaria de contribuir com alguns pensamentos...enquanto este, possa ser um espaço público, e livre para troca de idéias,
Do ponto de vista de alguém que pesquise arte e sociedade, é consenso entre os artistas, que misturar arte com solução social pode ser perigoso.
(Seria a estetização de um problema)
Já temos biliografia sobre o fim da idéia de elite como pirâmide, e sim de uma sociedade contemporânea de formato rizomático. Com diversos centros difusores de idéias.
Acredito que a atitude de agregar valor ao indivíduo urbano morador de rua, seja o núcleo central desta ação. E o que a enobrece.
Sobre a denúncia, faz parte do ramo jornalístico, e não artístico.Isto tb é consenso no meio.
A atitude é a ação mais importante, como iniciativa,
e as críticas só se tornam consistentes,
quando realizam novas e melhores atitudes e ações.
Esqueci de assinar, o comentário anterior:
sobrearteetc@gmail.com
Obrigado a todos pelos comentários, são muito importantes para nós que cultivamos esse espaço "público e livre para troca de ideias".
Marcos, obrigado pela leitura, e parabéns pelas iniciativas, espero contar com sua participação e opinião em nosso blog. Sempre enriquece a presença de quem está envolvido com todo esse turbilhão.
"Sobre" (não sei seu nome), eu concordo 100% sobre a atitude "agregar valor ao indivíduo urbano", sendo válida nesse sentido. Tampouco é um texto que defenda a crítica pela crítica. Este que aqui escreve, pelo contrário, acredita que a prática é tão importante quanto teorizar sobre ela. Desconhecer essa equação é o faz com que muitos dos "pensadores" e "formadores de opinião" fiquem atrás das mesas, apenas. Apenas quis pontuar algumas questões que acho importante quando pensamos nesse tipo de ação. Mas longe de criar empecilhos, prefiro que as pessoas que praticam as "atitudes" que você se referiu, provoquem-se e renovem-se ao se depararem com o texto.
Quanto à questão da "sociedade contemporânea rizomática", reconheço a tendência ao fortalecimento de linhas de pesquisa com esse teor nas artes e humanidades. Porém, tenho algumas dúvidas e questionamentos quanto à horizontalidade à qual você se refere.
E a denúncia a que me refiro não é como a jornalística. Ou a arte não pode ser uma forma abstrata que auxilie no processo que temos de questionamentos e (re)descobertas?
Fica a você e a todos o convite de participar do nosso Blog, enviando o texto (no formato de um blog - não tão extenso) para nosso e-mail misturaindigesta@gmail.com - Nós publicaremos com as devidas fontes.
Abraços a todos
TD JUNTO E MISTURADO
Sou obrigada a concordar com nosso amigo Alberto Monteiro, apesar de não me considerar reformista e poliana - como alguns amigos insistem em me descrever. Atribuimos a elite (OS OUTROS - já que esquecemos de nos incluir neste meio) a responsabilidade de sua "ignorância e alienação". O que está em jogo, na minha opinião não é diminuir o suposto abismo entre duas classes sociais heterogêneas e antagônicas; mas a construção de uma sociedade que necessariamente funciona através de redes de interdependência. (Afinal, nenhum rico tem interesse na violência gerada pela miséria, por exemplo).
Assim como acredito que discussões feministas ou étnicas reforçam as diferenças que os próprios movimentos objetivam desconstruir; penso que ao invés de se discutir a melhor forma de atingir e sensibilizar a elite, deveríamos estar discutindo possibilidades de interação entre os discursos, primordialmente dentro das instâncias escolares, manifestações artísticas e espaços públicos em geral. Parece um pouco romanceado, mas ao meu ver é uma estratégia mais eficaz do que a secular tentativa de imputar culpa e sentimento de solidariedade à elite. Sei lá...talvez esteja sendo um pouco otimista!!!
Ahhhh....me desculpem pela menifestação retardatária!!! rsss...
Postar um comentário