quarta-feira, 2 de junho de 2010

Bienal 2010 - Política, Rua e Rebolation

. . Por Thiago Aoki, com 1 commentário

Saiu, ontem, a lista de convocados para o evento que movimenta milhões e o Grafite está na lista. Poderia ser a seleção do Dunga, mas estou me referindo à Bienal 2010. Além da lista dos 148 artistas, os organizadores da Bienal afirmaram, em entrevista coletiva, que buscarão, neste ano eleitoral, uma exposição que possua olhar amplo para a política.

Prova disso é a confirmação da presença de pichadores, muitos deles idealizadores da fatídica intervenção no ano de 2008 - fato já analisado amplamente em postagem anterior. Como afirma o curador Agnelo Farias, "não tenho certeza se é arte ou não, mas certamente o trabalho deles é político". A organização também deixa claro que a presença dos pichadores se dará através de apresentações de seus trabalhos, por vídeos, fotografias, slideshows, afinal "não faria sentido convidá-los para pichar nem eles queriam ser cooptados pela instituição". Para este blogueiro, decisão mais que acertada, não só por da voz a novos atores culturais, como também por não fazer de gabinete uma expressão artística cujo cerne é o questionamento veementemente do "status quo" cultural.

Outro ponto alto da exposição deverá ser a homenagem ao aniversário de 30 anos da morte de Hélio Oiticica. Nada mais justo para uma Bienal que se proponha a falar sobre arte e política, intesecção tão bem feita pelo artista brasileiro, de referência internacional. Oiticica, que se considerava um anarquista, fazia questão de mostrar que a arte deveria extrapolar as paredes e chegar ao povo e às ruas. Neste sentido, levava consigo os famosos dizeres: "Seja Marginal, Seja Heroi". Com esse espírito, por exemplo, foi expulso do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1965, por levar integrantes da Mangueira vestidos com "Parangolés" - isso mesmo, pasmem, o mesmo nome da banda que lançou o hit Rebolation. "Parangolé" fora uma invenção do artista plástico que consistia, nas palavras do Wikipedia, em "uma espécie de capa (bandeira, estandarte ou tenda) que só mostra plenamente seus tons, cores, formas, texturas, grafismos e os materiais com que é executado (tecido, borracha, tinta, papel, vidro, cola, plástico, corda, palha) a partir dos movimentos de alguém que o vista. Por isso, é considerado uma escultura móvel". Vale lembrar também que a ideia dos parangolés foi inspirada em panos usados por mendigos do Rio de Janeiro. Sim, Rebolation, além de bom bom bom, também é cultura.


Documentário de Ivan Cardoso, 1979

Fora os "Parangolés", outra figura marcante da obra de Oiticica são os "Penetráveis", labirintos nos quais o espectador, ao entrar, interage de modo sensorial, através de olfato, paladar, visão e audição. Mostrando que para além da relação unilateral de contemplação, o público deve ser ativo e interferir no desenrolar da obra cujo funcionamento depende da atitude do próprio público. Deste modo, Oiticica brinca com a inércia e conformismo das pessoas, que simplesmente aceita o que lhes é imposto.

Oiticica foi um dos inspiradores e integrantes do Movimento Neoconcreto e Tropicalista, o qual considerava a "primeiríssima tentativa consciente de impor uma imagem 'brasileira' ao contexto da vanguarda". Infelizmente, no final de 2009, um incêndio destruiu mais de duas mil obras do artista, cerca de 90% de seu acervo que se encontrava na casa de seu irmão.

Sobre o desafio de abordar a obra de Oiticica em uma exposição como a Bienal, Moacir dos Anjos, outro curador, afirma que “serão dois conjuntos. Um deles terá o pensamento de Hélio sobre o que é ser herói, o que é ser marginal e seus ecos na arte de hoje. O outro recorte trará os projetos de utopia e distopia do artista, que serão vistos lado a lado de projetos do mesmo teor de agrupamentos como o Archigram [grupo de arquitetos britânicos utópicos, formado nos anos 60] e o Superstudio [grupo de arquitetos italianos utópicos, formado nos anos 60]”.

De qualquer modo, embora não saibamos o resultado de tudo isso, a Bienal 2010 -, que conseguiu multiplicar seus recursos de R$8 milhões (2008) para R$30 milhões (2010) devido à "adesão da sociedade" (leia-se: dinheiro dos empresários) - indica, nas suas preliminares, que certamente não será conhecida como Bienal do vazio. Melhor ainda, não só incorpora ao seu enredo novos "conceitos", mas principalmente novas práticas artísticas. Práticas essas que inclusive, metalinguisticamente, questionam a própria tradição da exposição. Junto com os pichadores, Oiticica invade a Bienal e picha em suas paredes, com letras garrafais e indefinidas, outra de suas frases favoritas, título de um de seus manifestos sobre o lugar da arte: "O Museu É o Mundo".

1 palpites:

Não vou me assustar se aparelharem a bienal.

(incêndio só acontece em cenários artísticos, incrível essa relação)

Abraço!

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