Duas possibilidades de premiações polêmicas movimentaram o cenário artístico e político durante as últimas semanas. No primeiro, o misterioso, supostamente inglês,
Banksy, artista guerrilheiro e de identidade desconhecida – há até quem diga que na verdade o nome represente um coletivo de artistas que subvertem a vida urbana - tem seu documentário
indicado ao Oscar 2011. No segundo, o australiano, fundador da organização
Wikileaks,
Julian Assange, que já
teve a cabeça pedida pelos republicanos norte-americanos por divulgar informações confidenciais da política externa ianque,
concorre ao Nobel da Paz.
Banksy já deu sinais, em seu
site oficial, de que aceitará o prêmio, apesar de não estar de acordo com o conceito de cerimônias de premiação. Tem sido frenquente este movimento na carreira do artista, que não se furta de buscar os holofotes para então, agir como guerrilheiro urbano. O
trabalho que fez para a série “Os Simpsons”, já comentado em
post anterior, é um exemplo sintomático. Não se sabe o que pode acontecer na celebração mais luxuosa no mundo, caso seja mesmo agraciado. Lembrei-me agora de quando os Racionais MCs aceitaram participar do Video Music Brasil, festa pop da MTV e causaram desconforto quando Mano Brown agradeceu sua mãe que “lavou muita roupa pra playboy” para ele poder estar ali. No caso de Banksy, o artista marginal já
deu um aperitivo para que os membros da gigantesca indústria cinematográfica norteamericana não esperem dele um discurso de celebridade. Vejam (abaixo) como apareceu um célebre mural de Los Angeles, terra do Oscar. Ele não assumiu a autoria do painel, mas de qualquer modo, são traços típicos, com soldados já desenhados em outros trabalhos.
Por trás de uma suposta loucura dos homens que mandam em Hollywood é preciso levar em consideração que teremos um dos Oscar menos badalados dos últimos tempos, com superproduções que decepcionaram e com um filme favorito (A Rede Social) que não teve tanto sucesso, sendo relativamente fraco em renda e público, apesar de todo o conluio para que o longa emplacasse. A ideia de levar Banksy à festa, longe de insana, é também um modo de voltar as atenções e retomar o diz-que-diz que necessariamente deve acompanhar o evento. Banksy e a Indústria Cultural vivem em uma retro-alimentação que parece tênue por ser paradoxal, mas que vem dando muito certo a ambos. Até agora.
Já para Assange, concorrer ao Nobel da Paz é um capital político fundamental para manter suas ações e redes políticas. O grande trunfo que possibilitou sua indicação e que pode levá-lo de fato à conquista é o precipitado prêmio dado, em 2009, a Barack Obama, sob o pretexto de que o estadista americano teria “ideias de boas intenções para reforçar o papel da diplomacia internacional e a cooperação entre os povos”. Premiar o hacker australiano que causa amálgama na política internacional estadunidense seria também um esforço em recuperar a credibilidade da premiação que privilegiou os Estados Unidos nas duas últimas edições, tanto ao premiar Obama como ao premiar em 2010 – a meu ver justamente - Liu Xiaobo, preso político da China, que tem polarizado a hegemonia global com os EUA. Assange, já havia conseguido apoio de diversas entidades e de alguns estadistas, como o ex-presidente Lula, agora tem a chance de levar uma das mais importantes e respeitadas premiações internacionais. O fato de poder ser contemplado com o prêmio, ridicularizaria ainda mais a perseguição política que sofre, sob a forma de um bizarro processo que está respondendo a organismos internacionais por ter feito sexo sem camisinha. Já pensaram um “criminoso sexual” com o Nobel da Paz?
Os dois casos, de Banksy e Assange, mostram nas entrelinhas como dois atores sociais, que têm atuado com êxito e certa popularidade em suas ações políticas contestatórias, são “reconhecidos” pelo campo hegemônico e centros de poder. Para Banksy, fica o enigma de como demonstrar ao maior público que já obteve em suas intervenções, o que um “artista guerrilheiro” faz diante de uma situação de tanto glamour e status. Já para Assange, um fôlego político e o desafio de que a responsabilidade em ser considerado um dos que mais contribuíram para a paz mundial não seja um empecilho para que suas subversivas revelações venham à tona. É aguardar os próximos capítulos.