sábado, 13 de novembro de 2010

No Escuro

. . Por Caio Moretto, com 3 comentários

Nada de extraordinário para um paulistano em trabalhar no feriado, ainda mais para um publicitário. Não fiquei mais chateado ou mais irritado por não poder viajar e já havia me acostumado com a idéia de que o dia acabaria bem com uma típica lasanha de microondas em meu apartamento não fosse por um arcaico e desagradável imprevisto: estava sem eletricidade.

Acabo de entrar pela porta principal e o interruptor está inútil, mas demoro um pouco para interpretar os sinais contraditórios. Subi de elevador e a luz do corredor funciona perfeitamente. Há algo errado. Tomo um susto com o gato preto do João - filho da mãe! – mas o xingamento é para o dono. Não estamos sem força, fomos cortados. Ele não pagou a conta.

Começo a me incomodar com os olhos amarelos do nosso invisível bicho de estimação e com as coisas que deixarei de fazer. Um momento de racionalidade me faz pensar as opções que tenho: dormir mais cedo ou lutar heroicamente contra a conspiração de meus colegas caloteiros e da Eletropaulo para ferrar o meu feriado. O momento passa. E a luta começa.

Horas e horas perdidas assistindo James Bond e MacGyver, a escuridão não tem a mínima chance. Uma passada no corredor para ativar o sensor de movimento da luz do elevador e consigo encontrar provisões e alimentos. Distraio-me um pouco comendo o pacote de Club Social e ela se apaga novamente, só para me provocar.

É hora de jogar duro. Encarrego o gato de manter a lâmpada acesa, um pouco contra sua vontade e vou buscar uma extensão. Será que tem gente que usa a tomada do corredor para economizar na conta de luz? Pode parecer ridículo, mas foi o que pensei quando constatei que nenhuma funcionava.

O gato não gosta de mim, mas faz um bom vigia de corredor. A luz apaga, ele se levanta, o sensor ativa, ele resolve ficar mais um pouco. Um ótimo método, mas insuficiente para meu novo objetivo. Decidi que para vencer essa batalha é preciso decretar vitória moral ao inimigo. Eu preciso ler um livro.

Encontro três velas de bolo. 1, 2 e 3. Talvez aniversários de algum sobrinho, talvez um colega de 32, que não quer esbanjar com um novo três a cada ano. Quantos anos teria o gato? Esqueço os números e acendo cuidadosamente cada vela, colando-as com sua própria cera no fundo de xícaras de chá. Uma na sala, para quando chegarem os outros moradores e duas para zombar do adversário com uma boa leitura em minha cama.

Dois “parabéns para você”. Acho que este é o tempo médio de uma vela de aniversário. Talvez seja proposital, para a gente usar um novo 3 a cada ano. Foi o suficiente para ler uma única página de Fernando Sabino. Uma que já havia lido, para retomar a história. Mas gol de barriga também dá vitória. E já é tarde demais para um paulistano estar acordado se divertindo. Afinal, amanhã terei que acordar mais cedo para pagar a conta de luz.

P.S.: Nenhum animal foi prejudicado durante a produção deste texto.

3 palpites:

Obrigado, João, o dono do gato.
Viva o esquecimento e o Caião escrevendo!
Abração!

Passava da meia-noite e eu precisava tomar banho. Por vício, vi que Caio tinha escrito algo. Fiquei curioso. "Tá bom, só o primeiro parágrafo". Se pudesse, definiria o texto assim, uma armadilha, na qual se você parar para ler o primeiro parágrafo, vai até os comentários! Está ótimo, parece que sua escrita amadurece décadas a cada postagem. Ironia finíssima e muuita fluidez. Não consegui achar nenhuma incoerência eheheh...Inveja e admiração!

Abraços!

Desculpem a demora, estava me procurando por aí.
Mas trabalhei, trabalhei, pensei, pensei e conclui: é mais legal me procurar por aqui.

Saudades rapaziada! Eu voltei para ficar!

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