Em 2008,
lembro que a Ciência garantia a segurança de todos frente ao que deveria ser o maior experimento realizado na Terra. O LHC (Large
Hadron Collider), cujo custo estimado era de cerca de US$ 8-10 bilhões, entrava em funcionamento naquele ano.
O objetivo principal dele era investigar uma das questões
fundamentais da ciência: a origem da massa. Que belo pretexto para
tantos bilhões!
Conforme
a física moderna, a matéria seria formada por pequenos corpúsculos
indivisíveis, as partículas elementares. O colisor nada mais seria
do que uma máquina gigante, construída nos subterrâneos próximos
a Genebra, que aceleraria essas partículas atômicas provocando
choques de umas contra as outras, só que com velocidades semelhantes à da luz. Nas colisões, então, a energia de movimento
das partículas seria transformada, segundo Einstein, com E = m
c², em outras partículas. Tal fato possibilitaria o estudo da
composição da matéria por meio das diferenças de massa entre as
partículas.
Mas - tinha que haver um mas - em meio às possíveis descobertas, as
colisões poderiam ainda criar mini buracos negros. Ora, buracos
negros não são aqueles trens que podem ser fruto da morte e
explosão de estrelas?? E esses buracos negros não concentram
enormes quantidades de matéria em seus centros, núcleos estes que
emitiriam sinais de radiação e que, literalmente, sugariam tudo
quanto é corpo celeste ao redor, tendo uma gigantesca força
gravitacional?? Não existiriam buracos negros, inclusive, cujo
diâmetro seria equivalente à distância do Sol a Saturno??
Desse
modo - ah, que primor de raciocínio lógico -, o LHC, ao
produzir buraquinhos negros em seu interior, com energias incríveis, destruiria o mundo??? Madre mía de mi
alma!! Partículas se chocam, os físicos entendem a matéria,
criam-se mini buracos negros, tudo ao mesmo tempo, e o mundo se
acaba: Genebra engole o planeta!! O
genebrino mais famoso do mundo não ficaria muito contente, imagino,
coitadinho do Rousseau.
Não. A
energia liberada pelas colisões seria equivalente ao voo de um bando de mosquitos. “O
Segredo” do LHC, portanto, estaria em concentrar energia em uma escala
submicroscópica. Ora, ora, ao espantar pernilongos, ninguém cria
buracos negros por aí. E os mini buracos negros teriam existência
muito efêmera, em questão de instantes eles desapareceriam, pois suas
massas são infinitamente pequenas para atrair qualquer outro objeto.
Não custa lembrar, são escalas. Adicione ao seu vocabulário
de graus, metas, focos, estimativas e investimentos: escalas!
Ainda em
2008, todavia, no Hawaii, dois malucos entraram na Justiça - sei lá em que
instância, talvez divina -, para impedir o funcionamento do novo
brinquedinho da Física, do mesmo LHC. Não há dúvidas quanto a isso, é
um belo pretexto para entrar na justiça: o mundo iria acabar!
Nos
nossos trópicos, no início do século passado, afe, isso tudo já tinha virado
samba. Assis Valente, um baiano que no Rio de Janeiro teve uma vida
bastante atribulada, compôs uma música até hoje muito conhecida. A canção ele fez por causa do anúncio da passagem do cometa Halley, em 1938, quando
surgiram boatos de uma colisão com a Terra e o consequente apocalipse. Carmem Miranda gravou:
“Anunciaram
e garantiram que o mundo ia se acabar
Por
causa disso minha gente lá de casa começou a rezar...
E até
disseram que o Sol ia nascer antes da madrugada
Por
causa disso nessa noite lá no morro não se fez batucada”.
Enquanto
uns constroem um trem com não sei quantos bilhões para dizer como
se constitui a massa dos corpos, da matéria, não contentes em
perceber que os corpos simplesmente existem, vejam só, outros entram na
justiça para evitar o fim do mundo. Porém, muito mais inteligente é
fazer samba com isso!
Mas - tinha que haver outro mas - em julho
último, quatro anos se passaram, nem a Justiça hawaiana ou divina
pode deter, o LHC continuou seus trabalhos e, num dia como outro
qualquer, ou não, ta-dan, o mega aparelho encontrou a partícula que
originou as demais partículas. Sim, o Bosón de Higgs, previsto pelo físico Peter Higgs na década de 1960, e ainda apelidada de
“partícula Deus” por outro físico, Leon Lederman, enfim,
existe. Quer dizer, há uma chance muito, muito pequena agora dessa partícula, que teria se formado em seguida ao Big Bang, não existir, conforme os cálculos feitos a partir dos experimentos no LHC. Quem sabe o Bóson de Higgs não tenha levado a alcunha em referência ao Deus
de René Descartes, para quem o mundo não teria por que não
houvesse uma Razão, “Deus”, quem sabe.
Bom,
talvez coubesse uma conclusão indignada, como quem vocifera contra a
Ciência inútil, culpa a política elitista e o sistema – ah, o
sistema – diante de tantos desesperos e misérias humanas. Uu, fico
com Manoel de Barros, para quem a arte e a poesia são igualmente
inúteis. Há gente que acredita em Deus, há gente que acredita,
digo, calcula a partícula, o Bóson de Higgs, ou os dois. Há gente
que não acredita em Deus, que não se importa com a matéria
atômica. Há gente que acredita e faz tanta coisa. Não vem ao caso, que preguiça, mas algumas coisas são mais
importantes que outras, não nego.
No fim
das contas, são todos bons pretextos pra seguir por aí. Fato é que com a
“descoberta” do LHC o mundo não acabou, pelo menos por
enquanto, uma pena para alguns, um alívio para muitos. Pior, não
houve samba, ninguém cantou, ninguém dançou, que triste, que chato. Um pretexto, é
uma questão de pretexto apenas, mas nem isso foi suficiente.
1 palpites:
Quantos bilhões valem o Bóson de Higgs? Alguém tinha que afirmar que porra toda deu certo, não?
Ahh! Agora estou tranquilo - a ciência explicou tudo...mas (mais um!) no dia 21 eu vou é aproveitar. Se o mundo não acabar, a única coisa que tenho certeza que vou ter é ressaca...
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