sábado, 4 de setembro de 2010

Eleições 2010 - Tiriricas e Batatas

. . Por Thiago Aoki, com 4 comentários

Essas eleições, repetindo o mérito da última copa do mundo, têm de tudo para ser uma das mais chatas e deprimente de todos os nossos poucos anos democráticos. Millôr tinha uma frase que era algo como "abaixo a extrema-esquerda, abaixo a extrema direita, mas, acima de tudo, abaixo o extremo-centro". Se pudesse, definiria nossos tempos como essa tragédia: a ditadura do extremo-centro. Se, ao invés de bobagens biográficas elencássemos algumas perguntas fundamentais, a resposta dos dois principais candidatos à presidência seria a mesma.


-O senhor é a favor da intervenção do governo na economia?
-Sim, para estimular o desenvolvimento, mas sem quebras de contrato e autoritarismo.
-O senhor é a favor da reforma tributária e do corte de impostos?
-Sim, mas de forma responsável para não afetar áreas fundamentais
-Como o senhor vê a relação da economia com o meio-ambiente?
-É possível que o país se desenvolva economicamente de forma sustentável.
-Qual a relação de seu governo com os movimentos sociais?
-Vamos manter o diálogo, mas sempre respeitando o Estado de direito.


Não, eu não queria Stálins e Hitlers, mas me dá uma coceirinha saudosista pensar que já tivemos Brizola e Lacerda. Que algum dia fomos pautados em uma discussão de como deveria ser constituido nosso Estado e qual projeto de nação gostaríamos. Hoje o que temos é isso. Se você duvida, entre no site de qualquer um dos candidatos e busque, por exemplo, entender as estratégias dos futuros governos para a cultura. Se você encontrar algo que não seja amplo e superficial, alguma diretriz ou plano estratégico e pragmático, por favor me envie.

Esses dias, o ministro da cultura disse que Tiririca, candidato a deputado federal, faz "deboche com democracia". Na verdade, acho é que falta deboche com a democracia. Falta, como tudo no mundo, sair de uma certa hipocrisia do politicamente correto, ser um pouco mais agressivo, no sentido de questionar essa coisa disforme que a democracia brasileira. Isso porque passamos quatro anos sem fazer absolutamente nada no que se refira a uma ação política, para, às vésperas da eleição, criticar com sete pedras um "palhaço" que diz que "pior que tá não fica". Claro, ele não tem instrução, formação, conhecimento político, blá blá blá. E pior é dizer que o povo vota no Tiririca porque "é burro". Muito mais eficiente entender a estapafúrdia candidatura como uma crítica a esse modelo por si só ridículo, com brechas e sujeiras, sem o mínimo de dignidade, moral, intelectual e política.

A democracia brasileira parece uma grande peça de Nelson Rodrigues, onde tudo está podre e tal podridão é proporcional à altura que o personagem ocupa dentro do centro de decisões. Eike Batista disse, no roda viva, que pouco acompanha o debate eleitoral. Ser o oitavo homem mais rico do mundo tem suas vantagens. Ele sabe que continuará como está, seja qual for o novo preseidente. Ele continuará vencedor e rico. Mas, contrário do que disse, não porque ele não dependa do governo, mas porque o governo depende dele. Isso que é crescimento sustentável.

Walter Benjamin, propõe pessimistamente em suas "Teses sobre a filosofia da história" que a história é como um amontoado de escombros que se acumulam com o tempo. Acho que Machado de Assis aprofunda a análise quando fala sobre o escravo de Brás-Cubas em sua infância, Prudêncio, que na época era menino como seu senhor. Após anos de humilhação, servindo de "cavalinho" e aguentando a tudo calado, resignado, Prudêncio é liberto. Brás-Cubas o encontra, já velho e surpreende-se com a cena. Em uma praça pública, lá estava Prudêncio, homem livre, chicoteando um escravo que comprou com o dinheiro da alforria. Para mim é uma das passagens mais trágicas e sintomáticas de nosso mundo. É como se reproduzíssemos a cada segundo esse monte de escombros, essa dominação, essa sujeira. Pense em seu tabalho e fica mais fácil de visualizar prudêncios e mais prudêncios. Porque é isso que as eleições e nosso direito têm sido, fábricas de prudêncios que reproduzem exatamente aquilo que se critica: a apatia.

Pelo amor de Deus - sim, ele existe - este não um texto niilista, essa ideia de que é melhor perecer do que lutar contra o invencível. O niilismo é a filosofia que, em nossas universidades e centros intelectualoides, tem subsidiado o conformismo, a inoperância. Tampouco se defende aqui o inverso da democracia, a ditadura - balela pensar que aquilo sombrio foi uma época de florescimento. O fato é que, como alguém disse, a "democracia pode ser arma e armadilha", no nosso caso tem sido apenas armadilha.

É uma provocaçãozinha por uma ação política que seja transformadora, que busque o novo, que não apenas se defenda e critique, mas que tenha propostas de ataques. E principalmente que não se esgote em períodos de voto. Não sei se ela existe, mas é melhor construí-la.

E rápido.

Por hora, aos vencedores as batatas.

4 palpites:

Não gostei desse texto, Chininha, apesar de concordar com alguns pontos.

Concordo com:
1) Centrão na polítca brasileira. Recentemente, o Frei Betto escreveu sobre isso. Folha de São Paulo, 2 de setembro de 2010, tendências e debates.
2) As respostas iguais (consequência do item anterior)
3) Walter Benjamin com Machado de Assis, principalmente no que diz respeito a muitos "escombros" na política brasileira. (Mas as conclusões a partir disso, não)

Discordo de:
1) A candidatura de Tiririca como uma crítica de um modelo ridículo, com brechas e sujeiras, sem o mínimo de dignidade etc.
2) A democracia brasileira como uma fábrica de "Prudêncios", e reprodução da apatia.
3) Niilismo como fundamento do conformismo e da apatia. Menos ainda de que esse niilismo esteja amplamente difundido na Universidade - não generalize seu olhar...
4) As opções para a democracia, "arma ou armadilha". (É uma brincadeira infeliz. Nem arma nem armadilha.)
5) Do carecer de uma ação política transformadora que busque o novo, e não apenas critique, se esgotando em períodos de voto...

Porém, pra discutirmos cada um desses pontos, precisaria escrever um textinho novo.
Depois.
Convido o Mekaru a reaparecer, também, porque sei que ele gosta dos "espinhos" levantados.

Abraços

Sua negativa já valeu o texto! Era exatamente essa a ideia.

Das suas discordância, reitifico - e relendo o texto não está claro mesmo - apenas a 1) é um mal entendido. Não sou entusiasta deste candidato hehehe. Apenas acho que a política, como um modo de ascensão econômica dá essa brecha, de pessoas que nada querem com isso buscar o posto para ascender socialmente. As brechas e sujeiras é que levam a esse tipo de candidatura. Não que ela tenha como intenção a crítica desse modelo, mas é consequência. 4) foi uma ironia, eu também não concordo com essa definição simplista.

O resto tá aberto.

De todos estes, queria só comentar sobre o niilismo. Acho sim que há, pelo menos tenho visto, e aqui não falo apenas das humanidades. Ao meu ver, tem sido quase que padrão a ideia de não se envolver com política pois, quase que cientificamente, não há saídas. Acreditar em qualquer ação política é quase que entregar-se ao sentimento, desprezando-se a razão, a luz. E é claro que é generalizado, e é claro que erradamente(aí concordo com você), como toda "provocaçãozinha"(acho que você pode falar melhor sobre o tema pois está mais envolvido, com certeza tem muita coisa boa acontecendo também, certo?).

bjs..

"deus existe e é um reacionário"
alguma personagem de jão do miséria...

"Lenin vive e abriu uma padaria", o miséria devia se invumbir de quadrinhar isso tbm hehehe...

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