VÍDEO: MURILO CAMPANHA CONTA ITATINGA

O psicanalista Murilo Campanha fala sobre Itatinga, um dos maiores bairros de prostituição da América Latina, onde ele tem seu consultório.

O nadador

Uma crônica de Hugo Ciavatta.

Ainda que as bolachas falassem

Crônica de Fábio Accardo sobre infância e imaginação

Ousemos tocar estrelas

Uma reflexão de Thiago Aoki.

Entre o amarelo e o vermelho

Uma crônica de Hugo Ciavatta

O homem cordial vinhedense

A classe média vai ao barbeiro. Uma crônica de Caio Moretto.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Tipicamente chileno

. . Por Caio Moretto, com 6 comentários

Difícil dizer o que é típico de um país. Tenho certeza que os chilenos comem mais no McDonald's do que nos restaurantes de comida chilena que aceitam dólares e têm cardápio em diversos idiomas. Por isso, no Chile, fui ao McDonald's. Lá encontrei um divertido McItália, que levava a mesma carne dos outros lanches e um exótico creme de abacate. Achei engraçado. Nunca havia associado Itália a abacate.

dog-de-abacate

No dia seguinte, passeando pelo centro de Santiago vi uma barraquinha de cachorro quente super movimentada. “Vou descobrir qual é o dogão tipico do fim de expediente chileno”, pensei. No cardápio, desses bem feitinhos, impressos em gráfica, estava em primeiro lugar: hot dog brasileño. Pão, salsicha e o exótico creme de abacate. Apesar de ser um grande entusiasta, não conheço todas as variações da baixa gastronomia brasileira. Sei que paulista come hot dog com purê de batata, que carioca tira sarro e que prensado é coisa de fim de balada. Mas nunca ouvi falar de cachorro quente com abacate.

Claro que eu fui em restaurantes chilenos e comi todas os pratos que o turista deve comer. Mas garanto que se você se for à Santiago e ver alguma comida com creme de abacate pode comer com vontade. Abacate não assumido é tipicamente chileno.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Ao Senhor (parte III)

. . Por Unknown, com 2 comentários


Não me diga também que religião é perda de tempo, puxa vida, com a sacolinha de PhDs que o senhor possui, muitos lhe dão ouvidos. Será mais um, de peso, pra ampliar o coro de “futebol, política e religião não se discute!!!”, por exemplo. E, não é por nada, não, se uma boa música não lhe convence, se o senhor pensa que é perda de tempo, pois convertendo as horas rezando e com a alma entre o céu e o inferno poderíamos nos aprimorar profissionalmente, melhorar de emprego, enfim, até praticar esporte e garantir uma vida saudável, a carreira que escolhi precisa das religiões. A política, vá lá, é chata, toda cheia de almofadinhas disfarçados, ou não, mas é imprescindível. E eu adoro futebol, vai. Então dá uma ajudinha... por favor, vamos valorizar as religiões pelo menos...
Outra, com esse moralismo todo que o senhor parece desfilar, dizendo que o Homem é bom, que o que importa é contemplar a natureza... Ah, beleza, mas a gente já é grandinho pra saber que o mundo está cheio de coisas ruins, de estupidez, de crueldade... Está vendo como o senhor é cheio de “religião”... O senhor somente retirou a palavra Deus e colocou outro nome pra esse trem aí, sô, chamou abstratamente de Homem, de Natureza. Mais uma vez, nenhuma novidade, convenhamos... Quer tanto criticar o Moralismo das religiões e acaba sendo tão moralista quanto... E isso é complicado... a única coisa que posso te pedir, diante de atacar moralismos e cair em outros, é para que tenhamos um mínimo de (auto)reflexão...
Observe uma coisa, por favor, a quantidade de reticências que a minha escrita apresenta. Vá pelas outras partes desta carta, ou apenas passe rápido de uma parte a outra. Reticências são um vício, me dói sabia? Por favor, peça a um colega do senhor entendido em computação que invente uma nova ferramenta textual para os nossos conhecidos programas de edição de texto. Aquele que mais uso e nada sei: o Word! Se arrastar o barra de rolagem a direita, percorrendo o texto rapidamente, poderá ver, quem sabe, como aparecem as reticências... Começo a achar que são sujeirinhas... A nova ferramenta textual então poderia se chamar “Vassourinha”!!! Assim o texto ficaria limpinho, limpinho, sem crise, o que acha?!
Quanto ao Homem e a Natureza, ainda, pra ficarmos mais próximos temporalmente, Tolstoi já apresentava nuances disso aí... Tudo bem, ele não é nada “científico”... humpf... Mas eu ainda prefiro Dostoievski também, preso na loucura humana, de uma racionalidade irracional, em convulsão por um fluxo de pensamentos absurdos... Ah!! ... Se o senhor continuar com essa pose equilibrada, durona, cheia de razão, metódica e sabida, todo coerente, seguro, de um pensamento claro, linear, “com certeza”, enfim, vou ter que continuar sozinho com as minhas ficções, com as minhas mentiras, não vou querer ser seu amiguinho... Continuo lá, imaginariamente, e só imaginariamente com os delírios do parceiro Riobaldo. Ele é um sujeito bom também, mas cheio de angústias, de lembranças, de sofrimentos, de medos, teve uma vida confusa... Sabe, ele não me faz muito bem... já o deveria ter abandonado faz muito... entretanto, vira e mexe fico inventando desculpas esfarrapadas pra ouvi-lo, quem sabe, pra que a minha história seja diferente da dele. Porém, a tristeza dele me aperta de um tanto...
Te faço assim uma sugestão, um convite, a partir do que pude presenciar recentemente ali na Catedral. Vai lá, vê se assisti a um concerto na Catedral da sua cidade, mas que seja com um coral também, pelo menos! Depois me conta! E a gente tenta trocar figurinhas! Ok?! E não carece de pressa, não, pois a vida é perigosa...

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ps.: Como dito no início, na primeira parte, este texto foi escrito, mais ou menos, em outubro, novembro de 2009. E apesar do pouco tempo, confesso que vivi um estranhamento muito grande quando fui revê-lo antes de postá-lo aqui, é como se não fosse eu quem o tivesse escrito, ou como se eu tivesse vergonha por ter escrito isso. Achei profundamente bobo o texto, mas enfim, escrevi e decidi que deveria colocar aqui também, pois ele já havia sido publicado na 2ª edição (ou edição 010) da revista Casuística. Aproveito, ainda, pra falar sobre os comentários que apareceram na segunda parte, publicada semana passada. Onde eu iria parar como isso? Bom, quando eu me deparei com essa conversa do Richard Dawkins pela primeira vez, logo me veio a cabeça Guimarães Rosa (exato, sou uma espécie de grouppie do escritor) e era minha intenção tentar aproximar estes dois universos na carta. E, sim, nada mais blasé, ou melhor, bastante “meta-intelectual”, que escrever para alguém que não o irá responder, sequer lê-lo, é muito descabido de minha parte. O recurso torna-se ainda mais infantil, ou demodé :P – risos – quando pensamos no âmbito de (possíveis) leitores do blog. Não deixa de ser uma aposta, de qualquer modo... e mesmo que seja pra errar o alvo O.o

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Ao Senhor (parte II)

. . Por Unknown, com 5 comentários


Sabe, meu rapaz (me perdoe a intimidade precoce, mas na minha terra, antes de cruzar o “largo rio poluído” e chegar na Ilha Mais Grande, quando mal começa uma amizade, a gente já trata o outro como se fosse irmão, já põe logo dentro de casa pra tomar um cafezinho... precisa ver), não fique aí com esse seu papo “científico”, misturando estatística, auto-ajuda, biologia, física e química. Chutar o balde com as religiões, muitos já o fizeram, de Hobbes, Marx e os mais próximos, do século XX, e olha que o fizeram com classe, quero dizer, com propriedade, mostrando o quanto os caminhos da sociedade e da própria vida são desencaminhados... Nem precisaram de números e exemplos “concretos”, afinal, um moço esperto da minha terra já dizia, em suas primeiras páginas, que “cada um, com o que quer, aprova” (Guimarães Rosa). Portanto, as Igrejas também não se cansam de “evidenciar” a existência de Deus. E, olha só, imagina o “mundo” da literatura sem Mefistófeles, do Goethe, em Fausto. Tudo bem, vai, pra você, “cientificamente”, “estatisticamente”, não existe “mundo da literatura”, já que “a Arte é uma mentira” ... Peraí, não dizia o Picasso que “a Arte é uma mentira que nos ajuda a compreender a verdade”?! É... “ajudar a compreender” não é provar a verdade... Mas, pensa agora no “mundo” da filosofia, da parte de “cá”, do ocidente, pra simplificar, esquecendo o pessimismo de Schopenhauer, Heidegger, chegando em Foucault e passando por Nietzsche?! Tem razão... não faria a menor diferença, justamente porque, como você parece dizer, o que importa é o Homem e sua Bondade, a capacidade de fazer o Bem, não de ficar “pensando demais”... Mas ... E todo o século XX, que nasceu junto à Psicanálise praticamente... tudo jogado fora?! Ok... coisas que a Dona Probabilidade explica, já que, no fundo, no fundo, deve ser tudo coisa de gente mal resolvida... de gente “errada”, né?! ... “aleatória”... pra usar a linguagem mais apropriada... Não consigo arranjar argumentos, não adianta...

Mesmo assim... por favor... pare com essa ladainha, não percebe que está fazendo uma “Religião da Ciência”, já imaginou que chato se daqui a pouco todos só derem ouvidos aos escritos das revistas de “ciência”. Até mesmo a música pode desembestar em preconceito, violência, extremismo, na necessidade de afastar, excluir, aniquilar o Outro para se afirmar, alguns representantes do Black Metal norueguês que te expliquem, meu caro... eles também acham perda de tempo esse negócio de religião... se falar pra eles em Cristianismo então... noossa... (dica, assista ao Metal - A Headbanger's Journey - 2005).

O senhor já ouviu um sambinha?! ...

Na minha terra, que é bem, bem grande, e muito heterogênea, dizem que é a região mais católica, em termos absolutos, do mundo. Pois é, mesmo assim tem crescido o número de pessoas que aderiram ao Ateísmo. Por mais estranho que soe o “aderir”... É comum ouvir, “troquei” a religião pela Ciência. Veja, quando se diz “religião”, em geral, muitos estão se referindo ao cristianismo, porque, antes de qualquer coisa, mesmo que tradicionalmente católica, minha terra é muito cristã. Precisa ver como cresce o movimento pentecostal, neo-pentecostal, renovação carismática. Olha, é um “novo” mundo de tantas ramificações, subdivisões, me perco sempre, enfim, são cristãos. São muitos, já ouvi até que o espiritismo é não só uma “religião”, mas também uma “ciência”. Aí minha cabeça deu um nó... como assim?! ... difícil... Mas eu me referia a “troca”, então, em resumo, parece uma questão de crença em uma ou outra... Não quero bancar o relativista absoluto, só queria mostrar que o barato não é “trocar”, aí sim, tanto faz... Mas é a postura diante de cada uma delas, por favor, já reparou no seu blog, é de assustar as declarações ali, não? Quanta certeza... pior que muitas Igrejas, vou te falar pra você, viu... Intolerância tem em todo canto... Olha, nada mais démodé que uma postura evolucionista, não acha?! Ô atraso, rapaz... pensar que o fim da religião nos tornará melhores, construindo uma “nova” religião... que coisa, não? …

(continua)

segunda-feira, 18 de julho de 2011

São João

. . Por Fábio Accardo, com 0 comentários

Não sabia onde se agarrar. Sentia que não havia onde apoiar os pés e que cada vez o puxavam mais forte. Começara a enegrecer o olhar. As últimas forças pareciam estar nas pontas dos dedos, os quais estavam ali fixos na borda daquele órgão tão primordial. Imagens vieram a sua mente. Lembrou-se então de certa noite. Junho, noite de São João, festa. Recordou-se dos passos leves e despretensiosos de certa saia. Parou o caminhar. Imaginou aquelas batidas rápidas dentro do peito e a confusão de palavras que vinham a sua mente, mas que não conseguira pronunciar naquele momento. Dissera qualquer coisa. Os passos continuaram. Cerrou-se em seu mundo, desiludido, mas esperando que uma vez mais pudera sentir nas maçãs do rosto aquele ardor que ruborizava, mas que se acalmava com a delicadeza dos passos que faziam o ar do entorno se agitar, produzindo uma brisa leve e cativante. Foi de repente. A brisa chegou antes. Assim que se virara tornou a ruborizar a face, os olhos fixos, peito trepidante... sentira, então, um leve umedecer nos lábios, um toque repentino nas suas mãos e algum som sussurrado ao ouvido. Como que entorpecido sentiu seus pés caminharem. Fora levado de encontro a saia. Fora tomado pelos braços, conduzido pela noite e roubado de sua cena. Não resistira. Não havia motivos nem forças para isso. Deixou-se levar pelo encanto. Recordava-se agora de longas palavras trocadas, gestos jogados ao ar, sorrisos iluminando um lugar escuro, calores que esquentavam os corpos naquela noite fria. A mente lhe iluminava a memória com o sentimento doce que não conseguira descrever, nem naquele momento e nem em outros. Somente sentira. E por mais que quisesse, e sentia vontade, de explicá-lo, não podia. Assim como não podia mais suportar a dor que sentia nas pontas do dedos. Estava prestes a se entregar. A escuridão já cegava seus olhos e não conseguia mais mirar coisa alguma a sua frente. Era demasiado forte para seu peito vazio de sentimentos. Decidiu então, num surto de racionalidade, entregar-se. Desistia daquela batalha. Não era mais uma disputa na qual queria continuar guerreando. Esvaiu-se. Seus pés já não tocavam mais o chão - estava apaixonado.

terça-feira, 12 de julho de 2011

O Meta-Intelectual

. . Por Thiago Aoki, com 17 comentários

Livremente inspirado, mas sem tanta grandeza, na brilhante crônica “Meio Intelectual, Meio de Esquerda”, de Antonio Prata, um dos preferidos pelos responsáveis deste irresponsável blog.

O meta-intelectual trocou o bar meio ruim por um refinado e exótico restaurante com comida tailandesa, árabe ou de algum local longe daqui, onde, no menu ou na ambientação de alguma conceituada artista plástica, pode-se conhecer todos os detalhes daquela deliciosa culinária e cultura. Mas claro que ele dá uma passadinha no Wikipédia antes da experiência gastronômica para voiciferar algumas informações que – ele torce – ninguém da mesa saberia antes daquele encontro.

Não tem mais como exemplo Betão, garçom oprimido que hoje está desempregado, mas o culto “consultor de mesa”, preparado para lidar com o meta-intelectual – sim, o mercado está difícil. Este neogarçom aproveita deixas para sugestões pertinentes e encanta ao falar em um estrangeiro perfeito o nome da comida, contando um pouco de como surgiu aquele prato através de uma imaginativa lenda daquela cultura.

O meta-intelectual assim se chama pois adora ser intelectual. E deste modo começa o bate-papo quando conta sobre um dia em que passou suas férias numa tribo... quer dizer, numa comunidade - tribo é um termo preconceituoso e o meta-intelectual adora se prender a termos - indígena e quanto aprendeu com aquele povoado, com aquela cultura diferente, com outros valores e práticas sociais. Afinal, o meta-intelectual respeita muito a diversidade! Claro, não suporta pessoas fúteis que usam roupas padronizadas e escutam sertanejo no posto de gasolina enquanto bebem uma cerveja qualquer. Mas adora discutir detalhes da Arte Naifi, tão popular e enraizada; ou do Mestre Molina, um homem do povo com tanta qualidade estética em sua obra; ou mesmo declamar versos decorados do Patativa do Assaré, poeta do sertão, enquanto toma uma cerveja alemã artesanal de trigo. Ah, esqueci-me de dizer, é preciso entender o processo de formação de uma cerveja ou de qualquer bebida alcoólica para se tomá-la. E ai de quem diz que, depois da segunda garrafa, Baden Baden é mesma coisa que Itaipava. Isto é inconcebível para nosso personagem, afinal, o meta-intelectual não bebe, mas sim degusta, faz parte da experiência gastronômica.

Durante o papo, percebe-se também que o meta-intelectual tem um leve gozo no olhar quando solta propositadamente expressões como: “faço ioga”, “sou vegetariano”, “sou sincretista”. Não, você não perguntou pra ele, mas ele sempre dá uma contornada no assunto para chegar nestas expressões. Você diz “Nossa, estou com dor nas costas” e ele responde “pois é, lá na ioga, que faço às quartas-feiras...”. Você diz “Estou morrendo de fome” e ele responde “Eu também, espero que tenha opções vegetarianas aqui, pois eu sou vegetariano”. Você diz “Meu Deus do Céu” e ele responde “Falando em Deus, sou sincretista, acho que Deus se manifesta de diferentes maneiras. Adoro o caminho do meio e os rituais do candomblé e da cultura afro (claro, menos o pagode). Aliás quando visitei os quilombolas...” O ateísmo está caindo de moda entre os meta-intelectuais, sincretismo é mais, digamos, contemporâneo.

O meta intelectual odeia que um médico seja chamado de “doutor” sem nunca ter feito um doutorado, mas adora se intitular como “curador”, mesmo que seja de uma sessão de filmes - Lado B, é claro - para os amigos meta-intelectuais. É um bom programa para o pós-janta e quando você menos espera ele tece o seguinte comentário: “a fotografia desse filme é maravilhosa”. Esta é uma típica frase meta-intelectual. “Adoro o cinema iraniano” é outra.

Para o meta-intelectual, o sexo não pode ser tabu e é um bom programa pós janta, mas com algumas regras. Beijar alguém do mesmo sexo é libertação, mas ir a um baile funk de mini-saia é opressão masculina. A não ser que essa condição esteja pautada em preceitos feministas da década de 60, onde transar com várias pessoas era libertador. Do modo contrário é ceder a um padrão machista de comportamento. Também vale a “nudez artística” ou o “kama-sutra”, que são expressões muito positivas para o meta-intelectual.

O meta-intelectual não é meio-de-esquerda. A revolução para ele não é um propósito coletivo e a política está um pouco démodé, embora se considere sempre politizado e bem informado. A revolução é interior. Mas calma, isso não é auto-ajuda, o meta-intelectual tem repulsa à auto-ajuda e ao senso comum. A revolução é individual e se dá através das artes contemporâneas, ou de autores que quando se lê logo se pensa: agora sou diferente da maioria, li este autor. Trocou Marx Por Nietzsche. Trocou Cuba pela França. Trocou consciência de classe por diversidade cultural. Trocou igualdade por liberdade. Trocou comunismo por niilismo.

Certo dia, quando perguntado se era comunista, Lula respondeu: “Não, sou trabalhador”. Se a mesma pergunta fosse feita, o meta-intelectual, no almoço do dia seguinte, ouvindo um bom jazz da saudosa New Orleans do início do século XX, acabaria de degustar sua salada vegetariana tailandesa, tomaria um gole do vinho francês e diria: “Não, sou culto”.

- “Gerard, o que você sugere para a sobremesa?”

domingo, 10 de julho de 2011

Ao Senhor (parte I)

. . Por Unknown, com 1 commentário

(texto de novembro de 2009)

A Richard Dawkins,

Olá, acho melhor me apresentar primeiro. Sou um sujeito que faz pouco tempo o conheceu, casualmente, através do contato com um de seus livros. Sei que é estranho dizer isso, mas escritores são assim, em sua maioria, os conhecemos apenas pelo que escrevem. Fiquei muito surpreso com a beleza apresentada pela edição brasileira de Deus, Um Delírio, é de prender os olhos. Quando em minhas mãos, corri logo os olhos pela capa, contra-capa e orelhas desse livro de tantas páginas. Por todos os cantos, pude notar o quanto o senhor é celebrado internacionalmente, admirável. No entanto, ao longo dos anos, desenvolvi em mim algo que pessoalmente repudio, sem falsa modéstia: superficialidade e proselitismo. Quando abri o livro, li rapidamente partes da introdução e fui e voltei pelos índices e capítulos de sua obra, então, deixei-a de lado.
Tenho profundo apreço por posturas agnósticas, céticas, e hoje estou mais inclinado ao ateísmo também. Digo hoje, pois sou um bom burguês do século XIX, sabe? Quando “a coisa aperta”, me encanta a fé das pessoas, começo a acreditar e confiar nelas, me emociono até. Já em outros momentos, se me aparecem coisas cada vez mais tristes, indiferentes, me fecho, distribuo reduzas e quero que tudo e todos se explodam em seus egos imbecis. Uma música, que conheci faz pouco, diz bem o meu sentimento nesses instantes, Eu Tou Cansado dessa Merda, da Banda Eddie: “Nêgo!/Eu tou cansado desta merda/ Da violência que desmede tudo/ Da minha liberdade clandestina/ De ta no meio dessa briga/ Chega!/ Da gente tá se apertando/ Da ignorância insandecida/ Se esquivando de estatísticas/ A minha paz, faz tempo, ta querendo trégua/ A minha paciência se atracou como ela/ Eita!/ Que o sangue pinga nas notícias/ Vendidas como coisa bela/ A merda já tá no pescoço/ E a gente acostumou com ela/ Nunca se sabe o que vai acontecer/ Nunca se sabe, pode acontecer/ Nêgo!/ A máquina acordou com fome/ Vem detonando tudo em sua frente/ Comendo ferro, carne e pano/ Bebendo sangue e gasolina/ Eita!/ Sentenciado ao absurdo/ De merda em merda emergindo/ Um dia afoga todo mundo/ E assim acaba a caganeira”. De verdade, nessas horas, não há Deus, Diabo, santo, padre ou pastor que me faça pensar diferente, não há moral, ou punição que me faça pensar que as pessoas possam “ser” diferentes, acabo junto daqueles que desejava não mais existirem: preso em um pensamento totalitário e vazio. Mesmo assim, sou um fraco, me derreto fácil e qualquer palavra boba já me deixa, também, igualmente bobo.
Tonto, como fiquei quando fui assistir ao concerto de uma Orquestra Filarmônica dentro da Catedral da cidade de Granada, aqui na Espanha. Sorte que era gratuito, porque do contrário dificilmente pagaria o preço pedido para um espetáculo como aquele. Sabe, costumam ser muito caras essas coisas. E ainda mais aqui, onde há muitas Igrejas, toda uma tradição com o catolicismo, hoje aliado ao turismo, imagine o senhor, seria por demais caro assistir a isso pagando... Felizmente, aquele concerto foi gratuito em virtude da celebração de músicos ilustres da região, bastante ligados à Igreja Católica... Nada como estar desacreditado do mundo, das pessoas, e continuar assim, porém, pelo menos sentir-se emocionar dentro de um lugar tão bonito, de uma brancura, de uma aparente harmonia, de uma quase tranqüilidade que forjamos, projetamos no espaço, nas cores. Queria pegar um pouquinho disso tudo, quase num roubo silencioso, por numa caixinha e levar comigo pela rua...

(continua)

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