sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O sermão de Pe. Antonio Vieiria sobre a morte de Eduardo Campos

. . Por Caio Moretto, com 0 comentários



Ontem, procurando um texto para compreender melhor essa reação bipolar das pessoas nas redes sociais a respeito da morte de Eduardo Campos, curiosamente encontrei um sermão de Pe. Antonio Vieira sobre o assunto. Na reflexão, o padre barroco tentava responder se era mais digna a atitude “the zoeira never ends” de Demócrito ou as lágrimas de Heráclito, o emo.

As pessoas - todos observaram o fenômeno - parecem ter se divido entre aqueles que partiram direto para as piadas ou para as análises políticas e aqueles que se sensibilizaram com a morte inesperada do ex-governador e ficaram nervosos com o desrespeito dos primeiros ao período de luto.

O padre, provavelmente observando situação semelhante nas redes sociais do século XVII, fez um interessante comentário sobre o caso, relacionando-o com uma possível origem da comédia. O riso – comentou - não pode nascer da miséria real, por sua ligação com a dor. Então, os comediantes criam ficções para que se ria da imitação da miséria - agora separada da dor -, essa sim risível. Se os problemas “fossem verdadeiros”, acrescenta, “seriam motivo de comiseração, e não de riso”.

O grande número de pessoas transformando a morte de Eduardo Campos em piada nas redes sociais parece ilustrar a distância que as pessoas sentem de seus representantes políticos, esses seres midiáticos nos quais parece ser tão difícil reconhecer qualquer traço de humanidade.

No sentido oposto, nos discursos de luto, a metáfora da proximidade parece ter sido recorrente. “Ontem mesmo eu o vi na tevê”, ouvimos as pessoas comentando, como se isso, de alguma forma o tivesse aproximado de nós e causado uma certa comiseração.

Parece que essa miséria real e a divisão de reações que ela causou acabou evidenciando uma ambivalência da mídia: ela aproxima ao mesmo tempo em que desumanisa.

Resta ainda um problema. Estivesse o Eduardo em um hospital, seria mais fácil nos juntarmos à comiseração de Heráclito.  Mas a miséria em questão sendo a definitiva, surgem algumas ponderações céticas: finda a vida, não acabou-se a miséria? Não estaria novamente o riso, portanto, separado da dor? 

Confiante no potencial desumanizador de nossa sociedade na forma como ela está hoje organizada, estou com o grupo que procura se sensibilizar com a miséria de qualquer pessoa, mesmo quando isso exige um esforço racional. Mas acredito que talvez nesse caso, ao contrário do que imaginaram os críticos, algumas pessoas tenham partido para a piada não por falta de sensibilidade em relação a miséria de uma pessoa, mas exatamente por considerar que a morte não é uma miséria, mas o seu encerramento definitivo.

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