Em uma livraria megastore, de um conhecido shopping de Campinas, durante o caos pré-natalino que o estabelecimento se encontrava, deparei-me com um livro cuja capa e título chamaram-me atenção: “Banksy – Wall and Piece”. Por mero prazer de fuçar, abri o livro pelo meio, em uma página qualquer e encontrei a imagem abaixo.
Aquela imagem era famosa e perpetuara-se através de blogs e entidades subversivas, contestadoras do status-quo, mais eu não sabia quem afinal era seu autor, Banksy. Continuei a folhear as páginas e a cada desenho ou intervenção artística me impressionei mais e mais com o artista. “Preciso divulgar isso”, pensei. E, logo fui à pesquisa – é claro, sem ter em mãos o exemplar não tão caro do livro, afinal, final de ano é quela pindaíba.
Do Wikipedia: “Nascido em Bristol, Banksy, aos 14 anos, foi expulso da escola e preso por pequenos delitos. Sua identidade é incerta, não costuma dar entrevistas e fez da contravenção uma constante em seu trabalho, sempre provocativo. Os pais dele não sabem da fama do filho: ‘Eles pensam que sou um decorador e pintor’. Recentemente, ele trocou 500 CDs da cantora Paris Hilton por cópias adulteradas em lojas de Londres, e colocou no parque de diversões Disney uma estátua-réplica de um prisioneiro de Guantanamo.” Preferi a definição do site João Ramos: “O Banksy é um artista urbano que cozinha problemáticas sociais até elas se transformarem em arte. Ninguém sabe, ao certo, quem ele é, mas conhece-se um sem número de stencils e graffitis satíricos e um punhado de intervenções, como quando colocou, clandestinamente, obras suas no Louvre, ou quando pintou a barreira de West Bank em Israel”
Notei que podemos depurar do “artista guerrilheiro” - categoria pela qual seus milhares de fãs virtuais pelo mundo o denominam - alguns tipos de linhas em seu trabalho. Alguns, como as figuras abaixo, são metalingüísticos, brincam com a ideia do que significa fazer um grafite e de questionar arte tradicional.
Outros, criticam a sociedade de consumo e do espetáculo, na qual a inserção do indivíduo dentro do status significa a exclusão da maioria da população. E, por fim, as figuras mais diretamente políticas, com relação especial com a polícia e os políticos. Símbolos como ratos, crianças e flores são também recorrentes, o que nos leva a uma perspectiva além do imediato.
Observa-se também a linha do pessimismo norteando as imagens e intervenções, mas não um pessimismo totalitário, niilista. É um pessimismo a la Walter Benjamin, que provoca e nos instiga a pensar um mundo para além das relações de dominação, ainda que seja empequenos traços na parede. O leitor atento pode perguntar: mas o cara critica todo o sistema de espetáculo e vende livro em shoppings centers? As duas únicas respostas que posso dar é que criticar o sistema não o isenta de pertencer a ele e que o único homem totalmente coerente, acabou morrendo na cruz.
Se você gostou, conheça mais sobre Banksy em seu site oficial.
Nego drama, Entre o sucesso e a lama, Dinheiro, problemas, Inveja, luxo, fama. (...) Entrei pelo seu rádio, Tomei, Cê nem viu, Nóis é isso ou aquilo, O quê?, Cê não dizia, Seu filho quer ser preto, Rhá, Que ironia
O Movimento Hip Hop, iniciado no final da década de 70, nos Estados Unidos deixou frutos para o Brasil. A periferia de nosso país, antropofagicamente, apropriou-se e ressignificou cada um dos elementos do movimento (rap, grafite, break), criando algo diametricamente distinto das origens estadunidense.
A explosão do Rap nas periferias tupiniquins foi fenomenal. O grupo Racionais MC's, por exemplo, recusando-se a aparecer em qualquer canal da grande mídia (seja do rádio, jornal, ou da televisão), vendeu mais de 500.000 cópias do disco Sobrevivendo no Inferno, pelo selo independente Cosa Nostra (criado pelo próprio grupo). A primeira aparição de Mano Brown na grande mídia fora durante a premiação do Video Music Brasil (ver vídeo abaixo), e em seu discurso foi provocativo ao agradecer à mãe que “lavou muita roupa pra playboy pra eu tá aqui”, causando mal-estar nos bastidores da MTV.
O sucesso era estrondoso, e abriu porta para ampla gama de rappers, como Sabotagem, MVBill, Gog, Rapin' Hood, De Menos Crime, entre outros. Entretanto, a tensão durante a desenfrada expansão do Rap, na periferia e nos meios de comunicação, teve um ponto ápice em 2005, segundo apura reportagem da Caros Amigos intitulada “Enquanto isso, na sala de justiça”.
Segundo a reportagem, em um dos shows do Racionais MC´s, em Bauru, interior de SP, um corpo assassinado é jogado sobre o palco, e o público vibra calorosamente. Brown fica sério e pede a todos uma oração pela pessoa morta e para o show. Brown convoca, então, uma reunião secreta, em 23 de janeiro, com boa parte dos grandes rappers brasileiros. Brown, visivelmente abalado, queria discutir a forma como os manos assimilavam as letras. Deixou claro, portanto a necessidade de separar a ideia de crime e de RAP. Entretanto, apesar da necessidade dessa separação ser consensual, houve, durante a reunião, uma divisão entre dois grupos. Alguns, como MVBill, Rapin’ Hood , por exemplo, defenderam que o RAP deveria entrar de vez à grande mídia e à casa dos ricos para conseguir explicar melhor para aqueles que estão ouvindo, a mensagem que quer ser passada, bem como expandir ainda mais o Rap no país -não é à toa que Rappin´ Hood apresenta programa na TV Cultura e MV Bill lançou seu livro, pasmem, na Daslu. Já outros, como os Racionais MC´s ou Facção Central defendem a manutenção da postura antimidiática e a o foco no público da periferia. De qualquer modo, evidenciou-se que a Indústria da Música percebera o fenômeno de massa que é o Rap, e que o modo como se dará sua expansão será crucial para os rumos do movimento.
Depois da apropriação de boa parte dos rappers e grupos de rap nacional - que fez com que o ícone de vendas e aceitação da classe média Chico Buarque afirmasse que o Rap é a nova e verdadeira MPB - a bola da vez para a famigerada indústria cultural nacional é o grafite. O debate feito internamente aos grafiteiros é, de certo modo, semelhante ao tensionamento ocorrido no interior do Rap.
Hoje é quase consensual, seja na grande mídia, como nas conversas informais, a colocação do grafite como uma oposição aos "vândalos da pichação". Porém, a origem do grafite tem a ver com toda essa cultura da qual deriva também a pichação. Muitos dos grafiteiros, acreditam que longe de ser uma oposição, é apenas uma das formas de pichação. Já outros, como Otávio e Gustavo Pandolfo, exitam.
Diferentemente da origem periférica, Os Gêmeos, como são conhecidos, são formados em desenho e comunicação pela Escola Técnica Estadual Carlos da Campos, iniciando seus grafites por volta de 1987, no bairro do Cambuci, São Paulo. Em recente entrevista ao Roda Viva, os irmãos disseram que preferem ser chamados de “artista plásticos”, ao invés de grafiteiros, mas não negam a influência do Hip Hop e da crítica social em suas obras, que hoje encontram-se em países como EUA, Alemanha, Inglaterra, Cuba, Grécia, China, Chile, Argentina, Portugal - sendo sucesso de críticas e público, chegando inclusive a pintar a fachada da famosa Tate Modern, em Londres, ou um castelo escocês do século XIII, por exemplo.
Osgêmeos, como se escreve a marca que criaram, foram muito criticados pela comunidade grafiteira por participar do filme da fornecedora de materias esportivas Nike, chamado Ginga - A alma do futebol brasileiro. Neste sentido, não puderam expôr no MASP, em plena cidade natal de ambos, porque, segundo o curador e crítico Miguel Chaia, a obra de ambos é baseada "na sobrecarga mercantilista e na linguagem muito imediata".
Seja como alternativa social para comunidades ou como um modo de apropriação do espaço urbano, o grafite, também conhecido como street art, ganhou também os museus e salões dos quatro cantos do mundo e hoje tem o desafio, assim como o Rap, de não fugir de seu início cujo conteúdo crítico e contestador contrapunha-se ao movimento de modernização que impunha à periferia um lugar deplorável dentro do processo de urbanização e modernidade (na verdade, a origem do grafite remete ao Império Romano, porém popularizou-se co manifestações durante o maio de 1968, na França, no Bronx negro dos Estados Unidos e nas periferias dos países subdesenvolvidos).